Foi absolvida ontem pela plenária do congresso Federal A Deputada Federal
Jacqueline Roriz (PMN-DF), velhos truques espúrios ganham conotação cínica
e institucionalizam o crime político.
“Em 2006 eu era uma cidadã comum, não era deputada, não era funcionária pública”.
A frase é uma confissão de culpa, mas foi peça de defesa da deputada, por mais
surrealista que isso pareça. Não contesta o delito, até porque está em filme, mas
concede licença para cometê-lo.
Como cidadão, sem mandato, portanto uma pessoa “comum”, Jacqueline Roriz
pode delinqüir. Com mandato, portanto uma pessoa “não comum”, não está sujeita
às conseqüências de seu ato.
À parte o conceito que divide os cidadãos em “comuns” e “incomuns”,
a tese transforma o mandato em habeas corpus definitivo. Com a agravante
de que o mandato absolve o crime eleitoral, ou seja, aquele cometido para viabilizá-lo.
Mas é apenas um dos truques do arsenal corporativo. O outro é o voto secreto,
que vai permanecendo ano a ano apesar das contestações internas e externas.
Em nome de sua abolição pura e simples, não o torna seletivo, adotável segundo
as circunstâncias.
Argumenta-se que ele não pode deixar de existir porque na circunstância de
exame de um veto presidencial, a pressão do governo seria insuportável e
retaliativa. Então, porque não restringi-lo a essa – e só a essa – circunstância?
A condenação na comissão, em votação aberta, e a absolvição no plenário,
em voto secreto, não deixam margem a dúvida: quando exposto pelo voto,
o parlamentar joga para a platéia, no caso, o eleitor; quando preservado pelo
sigilo, protege o colega – e a si mesmo, como ficou claro no principal
argumento da defesa, aquele que realmente sensibiliza o parlamentar
desses tempos: votem em mim, porque eu sou você amanhã.
O que o plenário da Câmara aprovou ontem foi que parlamentares têm
licença para delinqüir, o que não encontra respaldo, é óbvio, em nenhum código legal.
O PT, vide o abraço comemorativo do líder do governo, Cândido Vacarezza
(SP), na deputada absolvida, mostra que a intolerância contra a corrupção
sempre foi apenas estratégia eleitoral.